2020: O ano em que fomos forçados a ampliar nosso entendimento sobre o que são os direitos humanos
- apoemasite
- 10 de dez. de 2020
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No dia 10 de dezembro celebramos o Dia Internacional dos Direitos Humanos, data que rememora a elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, há 71 anos, na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). O documento é a grande referência legal; pela primeira vez na história foi estabelecida uma norma comum a todas as nações, sobre a proteção dos direitos e liberdades individuais e coletivos.
A declaração define os direitos básicos de todos os seres humanos que habitam nossa casa comum, o planeta Terra. Em seus trinta artigos, estão listados quais são esses direitos, independentemente do estado civil, financeiro, nacionalidade, cor, sexo e orientação sexual, política e religiosa da pessoa.
Nem sempre se tem dimensão de que não foi fácil chegar a este acordo. O documento foi elaborado após um dos períodos mais tristes da nossa história: a Segunda Guerra Mundial, um conflito militar global que aconteceu entre 1939 e 1945. O episódio ficou conhecido como "a guerra mais abrangente”, onde os principais envolvidos dedicaram toda sua capacidade econômica, industrial e científica a serviço do evento. Aconteceram inúmeros ataques contra civis, incluindo o Holocausto, e por conta do uso – inédito – de armas nucleares, os mortos chegaram a mais de 50 milhões.
Todo esse processo complexo e cheio de destruição foi movido principalmente por fatores como a rivalidade econômica e os ressentimentos guardados por fatos ocorridos no passado, além das questões nacionalistas que prevaleciam na Europa, no início do século XX. Ganharam espaço e força graças à desigualdade social e os desafios econômicos do momento, que promoveram um período de angústia e destruição.
Mas há flores que nascem do concreto...
Veja que interessante: há registros de que ainda na Primeira Guerra, no Natal de 1914 – logo no começo dos confrontos – soldados alemães começaram a cantar músicas natalinas e foram acompanhados pelos “rivais” ingleses. Essa união resultou em uma confraternização em torno da bola: foram 29 partidas de futebol improvisadas entre a véspera e o dia 25 de dezembro. Infelizmente os envolvidos nesse clima de “paz” foram punidos e os conflitos continuaram por mais três anos e meio, aproximadamente.
Esse fato mostra a busca e a necessidade da alma humana por entendimento e partilha, na verdade somos movidos pela coragem e confiança em nossos semelhantes mesmo quando não se fala a mesma língua, ou não se tem o mesmo tom de pele e costumes. A nossa natureza é assim, toda a história da ocupação do planeta se deu baseada nesta contínua busca de entendimento e parceria.
Com o passar do tempo, entramos no século XXI – período marcado por um novo jeito de viver. As relações são mais liquidas, como elucida o filósofo e sociólogo polonês Zygmunt Bauman: “Líquida no sentido de que as relações, com o passar do tempo, estão ficando cada vez mais superficiais e o contato entre os indivíduos é cada vez menor. As relações escorrem entre os dedos”. (https://www.oconhecimento.com.br/relacoes-liquidas.../)
É uma fase marcada pela fragilidade da apropriação de nossa identidade, dificuldade de entendimento da complexidade dos caminhos que a humanidade percorreu até aqui e das perspectivas atuais, de como lidar com a vida que temos, com uma fragilidade sobre comprometer-se. Deste modo, o sentimento de pertencimento aos lugares foi extremamente fragilizado, pois a internet e o mundo globalizado nos mostram que somos habitantes do planeta, com possibilidades de irmos e virmos com rapidez e conforto, até então nunca disponibilizados.
Ainda neste momento, o excesso de informação nos invade em qualquer lugar do planeta.
Nós, humanos, passamos a ser bombardeados todos os dias por um excesso de informação de todas as naturezas, paralelamente vivemos com processos ultrapassados educacionais e, assim, vimos perdendo a possibilidade de reconhecimento de significado em nossas vidas.
Passamos a nos tornar desconectados, por mais paradoxal que isso possa parecer, da complexidade e do fato de que nossa vida é uma viagem em um determinado tempo histórico por um período limitado. Fomos invadidos pela ilusão de vida sem sofrimento, sem esforços e sem a necessidade de assumirmos responsabilidade para com as coisas e para com nós mesmos.
A ideia é a de que trocas reais, de cultivo das amizades e dos amores reais, cheios de desafios e afetos, foram roubadas pelos longos tempos de exposição que vivemos na busca incessante por conhecimento e por qualquer sentimento que possa nos tirar da solidão profunda.
Agora, se você chegou até aqui, deve estar se perguntando: O que isso tudo tem a ver com a Convenção dos Direitos Humanos? Aproveito para te convidar a ler este documento na íntegra, vale a pena conhecer este marco construído por muitas mãos diferentes. Este documento pode ser uma inspiração para todos nós.
Você sabia que o Artigo 1- diz: Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.
Neste ano, o planeta foi invadido pela pandemia do Covid-19 – pandemia que afeta única e exclusivamente a espécie humana. Recebemos um recado claro, precisamos mudar a direção dos nossos caminhos, ou seremos extintos. Este ano fomos chacoalhados de uma forma como nunca vivemos antes, fomos convidados a abrir os olhos e a perceber:
1- Sim, somos interdependes;
2- Nossas mazelas sociais existem e são muitas – para termos a vida que desfrutamos neste período, promovemos muita injustiça social;
3- A importância da ciência e da tecnologia em nosso tempo;
4- Não construímos nada sozinhos, precisamos reconhecer a importância das parcerias.
Ou seja, no mês de dezembro de 2020, independe da sua opção religiosa, vamos viver um Natal diferente, um chamado profundo ao resgate da coragem e da confiança na vida. Sentimentos estes que em outros tempos, proporcionaram a criação da Convenção dos Direitos Humanos.
Referências bibliográficas:
• Segunda Guerra Mundial | Saiba tudo sobre o conflito! - Brasil Escola (uol.com.br)
• Cronologia dos Direitos Humanos | Diretoria Executiva de Direitos Humanos (unicamp.br)
• Declaração Universal dos Direitos Humanos | As Nações Unidas no Brasil
• Causas da Primeira Guerra Mundial | Educa Mais Brasil
• Sobre as relações líquidas e a fragilidade dos laços pessoais hoje - Portal Raízes (portalraizes.com)
Giovana Barbosa de Souza: Mestre em Direitos Humanos e Democratização pelo EUIC-Centro de Direitos Humanos da Universidade de Padova, na Itália. Especialista em Educação Infantil, Relações Públicas de graduação. Diretora de Educação e docente na UMAPAZ – Universidade Aberta de Cultura de Paz e Meio Ambiente, consultora de projetos voltados à Infância, Sustentabilidade e Direitos Humanos. Membro da Alliance for Childhood.

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